Só Entendemos a Importância Quando É Tarde Demais

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Excerpt #
Não sabemos do que vamos sentir falta lá na frente

Só entendemos a importância quando é tarde demais #

Não sabemos do que vamos sentir falta lá na frente #

Faz pouco mais de um ano que passei a fotografar com um pouco mais de seriedade.

De lá para cá, o que mais ouço de pessoas que não possuem o costume de tirar fotos — com câmeras dedicadas — é que depois dos smartphones as câmeras tornaram-se desnecessárias, praticamente inúteis.

Com a capacidade de produzir belas fotos de altíssima definição, os Smartphones realmente alcançaram um excelente patamar em relação ao potencial de fotografia e vídeo.

Dependendo da ocasião, pode ser impossível diferenciar uma imagem feita por um celular e por uma câmera de alto nível. Essa distinção é difícil até mesmo para olhos bem treinados.

Mas o avanço fotográfico dos smartphones não veio sozinho.

Era preciso uma força extra para estimular a necessidade de carregar uma câmera no bolso e tirar fotos o tempo todo.

Câmeras digitais já existiam quando chegaram esses celulares, mas as fotos ainda precisavam passar pelo ciclo de descarregar no computador, selecionar, transferir para o celular ou postar em algum lugar — alô fotolog!

A ideia de ter uma câmera de alta qualidade no bolso era interessante, mas nunca uma necessidade real. Foi assim que redes sociais voltadas a vídeo e imagem passaram a impulsionar o desejo de compartilhar o que estamos vivendo naquele exato momento.

Instagram e Snapchat foram os grandes motores da revolução fotográfica dos celulares. As pessoas queriam registrar uma cena, mas também mostrar que estavam participando daquele momento.

As câmeras frontais, originalmente com baixa qualidade e pensada para comunicação por vídeo, precisaram ser reinventadas. Os usuários estavam virando suas câmeras traseiras, com qualidade bem superior, para fazer autorretratos no ambiente.

Inclusive, a própria terminologia muda. O autorretrato desaparece, surge a Selfie.

Em 2013, Selfie foi a palavra do ano pelo dicionário Oxford. Já no ano de 2014, o Google anunciou que aparelhos Android tiravam mais de 94 milhões de selfies por dia.

Neste cenário, não demorou muito para a percepção funcional da fotografia mudar. O que antes era um registro do passado, um momento no tempo que valia a pena relembrar, passou a ser o efêmero registro instantâneo.

O que antes era um registro do passado, um momento no tempo que valia a pena relembrar, passou a ser o efêmero registro instantâneo.

A própria ideia de postar fotos antigas ganhou um termo próprio, Throwback Thursday, o famoso #tbt.

Foi necessário construir um contexto para justificar a postagem de fotos antigas, já que tudo agora era sobre compartilhar o que estava acontecendo naquele exato momento.

A ideia da fotografia como recordação foi ficando para trás.

A percepção de que a foto que não foi postada perdeu seu timing é muito presente.

Depois que o momento passou, parece que aquela imagem perdeu o seu valor.

Como consequência, apagamos fotos que poderiam ser importantes no futuro e perdemos todo conteúdo quando um celular deixa de funcionar.

Quando nos damos conta, registros dos anos anteriores vão desaparecendo.

É provável que você ainda tenha álbuns de foto impressa da época de criança, mas que as fotos tiradas 4 ou 5 anos atrás, num celular antigo, já tenham desaparecido.

Esse jogo de compartilhar o instante acabou ofuscando a verdadeira importância das fotos, olhar para o passado e resgatar aquele momento.

Só que, muitas vezes, as fotos que possuem real importância não significará nada para as outras pessoas.

Aquela foto meio torta e tremida, sentado com os amigos num sofá comendo Cheetos com guaraná, numa época onde todos ainda tinham cabelo e não estavam afogados em trabalho, filhos e contas para pagar, não teria nenhum valor especial compartilhada nas redes sociais.

A foto não tem um restaurante chique de um chef renomado, uma torre famosa de fundo ou uma praia paradisíaca durante as férias de verão.

Era só um sábado como qualquer outro.

Você conseguiu uma fita do street fighter emprestada, seus amigos foram na sua casa jogar e sua mãe deu Cheetos para enganar a fome da molecada enquanto preparava o jantar.

Poderia ser qualquer outro final de semana daquele ano, uma cena nada excepcional.

Mas é isso que faz, vinte anos depois, aquela foto ser tão importante. Tirada com a câmera de filme da sua mãe, aquela cena não carregava nenhum valor especial naquele momento.

Se fosse hoje e tirada com celular, o registro provavelmente teria sido apagado.

A foto não ficou boa e aquela cena acontece com tanta frequência, é fácil pensar que depois você pode tirar outra melhor.

Até que vocês cresceram. Cada um seguiu sua vida e aquela cena nunca mais se repetiu.

Quando comecei a fotografar, muito dessa percepção ainda não estava tão clara.

Eu tirava inúmeras fotos e sentia uma leve angústia, um sentimento de não ter onde compartilhar.

Para que continuar fotografando se eu nem tenho onde todas aquelas fotos?

Mas quando minha filha chegou, ficou muito fácil entender que cada dia é diferente e esses registros servem para congelar essa experiência no tempo. Hoje ela ainda tem 11 meses, mas já olho para as fotos de recém nascida e sinto um aperto no coração.

Mudou tanto, passou tão rápido.

Muitas dessas fotos poderiam ter sido deletadas em outra situação, mas agora sei que a verdadeira importância delas vem com o tempo.

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